LIVROS | Janeiro em 3 ★


Toda a Gente Nesta Sala Um Dia Há de Morrer 
Pensem numa premissa verdadeiramente original: Gilda é uma jovem lésbica (isto é importante para a narrativa, já vão perceber porquê) a sofrer uma depressão profunda. Desesperada por encontrar uma saída para o seu sofrimento, decide responder a um anúncio sobre sessões gratuitas de terapia numa igreja local. Porém, ao chegar, o padre julga que Gilda está ali para uma entrevista de emprego. 

Este livro foi-me apresentado – e, na verdade, tem sido este o feedback um pouco por todo o lado – como um livro extremamente humorístico, mesmo que tenha um dos títulos mais mórbidos de sempre. No entanto, acho que não nos cruzámos na altura certa. 

Para ser sincera, ri muito pouco com este livro. Sim, tem momentos muito cómicos – o paradoxo da igreja conservadora a empregar uma lésbica ateia é irónico e genial -, mas foram mais as vezes em que me senti inquieta e melancólica com esta leitura. A dificuldade da protagonista em encontrar apoio (quer na vertente clínica – com médicos e enfermeiros a despachá-la naquilo que é, para mim, o retrato da realidade de quem vive com doenças mentais -, quer na vertente espiritual – ao ver de perto a morte tantas vezes, afeiçoa-se ao niilismo) deixou-me mais triste do que reconfortada ou entretida. 

Perguntei-me várias vezes qual foi o propósito deste livro. A premissa estava lá e as reflexões sobre saúde mental são muito interessantes, mas sinto que a meio desproveu-se um pouco de propósito. Quanto ao final, não sei se encontro uma boa palavra em português que descreva o que achei, mas distasteful está na ponta da minha língua. 


Lizzie & Dante 
Agarrei neste livro sabendo ao que ia, mas precisava de uma leitura que puxasse mais ao entretenimento – mesmo sabendo que a história tinha uma conotação mórbida a dar o tom para todo o plot

Lizzie tem um cancro terminal e decide que irá aproveitar enquanto tem a sua (incerta) vitalidade para saborear a dolce vita num verão em Itália. É lá que conhece Dante, um chef que a ensina que, mesmo sabendo que o final está próximo, vale a pena lambuzarmo-nos com os melhores prazeres da vida, sem tréguas. 

Há várias coisas que não funcionam neste livro, para mim; os diálogos e as personagens são pouco realistas, a velocidade com que tudo acontece não encaixa, e os momentos de intimidade deixaram-me com um toque de vergonha alheia algumas vezes, admito. Mas dei por mim agarrada à leitura e a divertir-me genuinamente a ler este livro. 

Está a anos-luz de ser um favorito, não o recomendaria a todos e não vai ganhar um Pulitzer nem que fizesse um salto encarpado de pernas afastadas. Mas senti-me transportada para as ruas quentes de Itália e soube muito bem. 


A Estranha Ordem das Coisas 
Apercebi-me que gosto mais de ouvir do que de ler António Damásio. É um neurologista que fala do cérebro com a mesma dose de ciência e poesia, uma sensibilidade que apenas poderia estar reservada ao órgão mais misterioso do corpo humano, aquele que faz de nós… nós

Por já o ter acompanhado em tantas entrevistas, documentários e episódios de podcast, acho que comecei A Estranha Ordem das Coisas com sofreguidão e expectativas estratosféricas. 

A Estranha Ordem das Coisas propõe-se a explorar a origem das culturas. Como é que os seres humanos decidiram relacionar-se ao ponto de criar verdadeiros sistemas sociais e morais, ou até mesmo a arte? A resposta mais comum é a associação da inteligência à linguagem, mas António Damásio desafia-nos a pensar num outro elemento que, na sua opinião, é mais importante: os sentimentos. Esta premissa deixou-me muito entusiasmada porque a neurologia costuma fugir dos sentimentos como se fossem o anticristo, e aqui estava alguém a contrariar esse sentido e a tentar explorá-lo. 

Porém, não sei se o livro deu uma resposta ao desafio. Foram várias as vezes em que não só não concordei com as suas observações (mas quem sou eu na fila do pão, não é mesmo?), mas o que me desiludiu não foi a direção de pensamento contrária à minha e sim a fraqueza no argumento. Sinto que em todos os capítulos virava a página com a expectativa de que, aí sim, encontraria um ponto de vista fortíssimo para me deixar a refletir. Pelo contrário, achei que muitos capítulos acabavam numa dança redundante. 

É, ainda assim, António Damásio. É fascinante e acho que poucos falam sobre a forma como o cérebro opera com tamanha propriedade e sensibilidade. Talvez a culpa seja minha porque depositei muitas expectativas. Mas reconheço que esperava muito mais. 


As Melhores Crónicas de Amor 
Amo ler sobre o amor e acho que nunca me irei cansar. E quando se alia o tema às crónicas do Miguel Esteves Cardoso, os meus olhos brilham, porque ele fala de amor de uma forma única e divertida. 

As Melhores Crónicas de Amor é um título que não deixa dúvidas de que coleção se trata o livro. Em particular, debruça-se na relação que o autor tem com a sua mulher, Maria João, e as adversidades que juntos atravessam, principalmente no combate ao cancro. 

Não há como falhar com Miguel Esteves Cardoso. Nem sempre concordo com ele, nem sempre estou alinhada com a sua forma de pensar e sentir. Mas é sempre um prazer lê-lo. Surpreendentemente, não foi o meu livro preferido dele, mas não deixou de ser uma leitura deliciosa. Comovente em muitos momentos.


Poetry By Heart 
Foi o único livro que trouxe de Zurique – porque lá a literatura é, verdadeiramente, um luxo – e trouxe-o porque estava determinada a ler mais poesia. Sendo esta uma coleção de alguns dos melhores poemas, pareceu-me um bom ponto de partida. 

No entanto, para mim, não foi uma experiência consensual. Na verdade, foram mais os poemas em que me senti completamente desinteressada do que os que me conectaram. Admito também que comprei o livro um pouco às cegas, pensando que a curadoria seria mais contemporânea. Só quando o comecei a ler é que percebi que tínhamos aqui poemas arcaicos – literalmente, com a tradução ao lado. 

Não era o livro certo para mim e consigo perceber isso. Ainda assim, sublinhei algumas passagens sobre o afeto, a vida e a memória que quero levar comigo para sempre.


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Já leram algum destes livros? O que acharam deles?

1 comentário

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