MUNDO || Seta

Penso que uma das maiores sensações de impotência é quando sentimos que não estamos a cumprir os objectivos, metas ou sonhos que nos propusemos e, especialmente, no tempo a que nos propusemos. Este é um dos problemas de anotarmos resoluções, fazermos exercícios retrospectivos — como é o caso do 5 Year Journal, por exemplo —. Não há sensação maior de falha quando lemos (especialmente na nossa caligrafia) os sonhos que tínhamos preparados para nós para esta altura e não estão cumpridos, nem de perto.

É uma sensação muito solitária, também. Quer não os tenhamos atingido por culpa nossa ou porque a oportunidade não apareceu, é uma sensação que trabalhamos muito sozinhos e que fica a remoer na nossa cabeça durante muito tempo. Começamos a sentir-nos numa bolha estagnada e vemos — ou pensamos que vemos — o mundo a avançar e nós atrás do plano. Como se algo estivesse errado connosco e todas as pessoas conseguissem agarrar as oportunidades menos nós, todos conseguissem encontrar os seus sonhos e objectivos menos nós, todos conseguissem alinhar os astros no meio da vida imperfeita — que todos têm — menos nós. Como quando estamos a atingir O Muro da maratona e parece que mais ninguém o sente sem seres tu. Estás a dar tudo de ti, tentas manter o foco na meta, ignoras os sinais de fadiga do teu corpo e depois sentes um peso no peito por veres todos os atletas a ultrapassarem-te, a correrem mais depressa e sem demonstrarem tanto cansaço, muito mais velozes. Até a que se está a estrear na maratona está a correr mais depressa do que tu. Ninguém mais sente O Muro.

Há duas coisas muito importantes que têm de saber sobre este Muro; a primeira é que se alguém vos disser que também já passou por ele e nunca sentiu nada destas coisas: a) está a mentir descaradamente; b) não faz ideia do que é um Muro. Estes sentimentos são naturais. Não são os melhores do mundo, mas não naturais. A desmotivação, o cansaço emocional, a sensação de falha e 'ficar para trás'. A pontada de tristeza quando uns conseguem aquilo que há tanto sonhamos e nem um feixe de luz irradia para o nosso lado... Tudo isto é natural. O mais importante é sabermos o que fazer com estas sensações ruins, com estes sentimentos negativos. Pensarmos estas coisas em momentos em que estamos no fundo do poço não nos define. O que nos define é o que decidimos fazer com esses pensamentos. Em como podemos transformá-los em algo mais positivo, saudável e amável para nós próprios e para quem nos rodeia.

A segunda é que existe uma grande diferença entre não acontecer nada porque estamos sentados à espera e não acontecer nada embora estejamos a tentar. E se estão na segunda categoria, não desistam. Não desmotivem. Sejam sinceros convosco e coloquem as cartas na mesa, o plano todo em aberto. Reavaliem os métodos, as fórmulas, os caminhos. Mas não desistam nem se sintam falhados. A vida é uma sucessão de convites que acontecem graças a uma preciosa combinação de factores. E há quem consiga receber esses convites de uma forma mais rápida que outros. Não torna nenhum mais competente que o outro. Tornam-se apenas pessoas a aceitarem convites. E se estão a tentar, os convites vão aparecer. Mesmo que apareçam primeiro no correio de outros. Eles também merecem. Eles também estão na maratona. Vocês não estão sós.

A minha incrível amiga Bia costuma partilhar sempre comigo a analogia da seta. Quando pegamos no arco e puxamos a flecha para trás, na verdade, estamos a dar-lhe gatilho para ser projectada para a frente. Se não a puxássemos, se a deixássemos ficar precisamente no sítio onde estava, dificilmente ela teria a força e resistência para avançar. E na vida também é assim. Por vezes damos alguns passos para trás, que nos matam por dentro e destroem a nossa confiança, motivação e sensação de conquista, mas são esses retrocessos que nos permitem ter mais força para avançar. Porque quando chegarmos ao topo do telhado, sabemos qual foi o preço e o quanto nos custou lá chegar.

Criamos estas ideias erradas de metas relacionadas com o tempo que podem ser óptimos propulsores de conquistas mas também excelentes venenos mortíferos. É importante lidarmos com estas metas com o devido realismo e cuidado. O facto de um determinado objectivo não ter acontecido no período de tempo que esperaram não significa que não venha a chegar e também não significa que não fizeram nada para o conseguir. Não há nada de errado ou insólito nisso. Só precisamos de ser pacientes e resistentes a essas contradições. E continuar a ir à luta, continuar a investir nesses objectivos — e noutros —. Nunca deixem de investir em vocês.


9 comentários

  1. Gostei muito deste post Inês! Eu tenho, como qualquer outra pessoa, várias metas que quero muito alcançar, mas precisamente por causa dos motivos que escreveste, tento sempre não lhes dar timings apertados ou fazer planos a três e cinco anos. A verdade é que há mil oportunidades que há dois ou três anos não imaginei que teria e já me aconteceram coisas muito boas e muito más só porque eu entretanto entrei em portas que se foram abrindo e tive a flexibilidade de me afastar do caminho que tinha milimetricamente traçado. Definir metas anuais ou trianuais é giro e motivador, mas eu abandonei essa prática precisamente para evitar os sentimentos de desilusão ligados a fatores que normalmente não posso controlar.

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  2. Palavras tão bem escritas, sempre tão fantasticamente articuladas e em perfeita sintonia.
    Uma das coisas mais importantes que aprendi em 2017 foi que os pensamentos maus ou destrutivos, invejosos, que nos invadem não nos definem, como referiste... a forma como os projectamos, abordamos ou utilizamos é que diz quem somos e dita a nossa personalidade. Gostei muito de ver esta minha aprendizagem à luz dos teus olhos, muito mesmo!
    A tua amiga Bia parece ser alguém muito porreiro para falar sobre A Vida. Ela deve ser muito perseverante e resiliente, algo me diz que as vossas conversas são extremamente interessantes.
    Vou colocar a simples palavra SETA na minha agenda, para me lembrar de tudo isto que nos dizes aqui. Deixaste-me com um potezinho de esperança para uma fase menos boa da minha vida! <3

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  3. Sabes aquilo que eu mais gosto nos blogs? O facto de, além de nos entreterem, nos poderem dar conforto também. Naqueles momentos em que nos sentimos inseguros, mais stressados, mais tristes, mas nem sabemos o que dizer nem com quem partilhar. E, nessas alturas todos nós nos refugiamos em algo, uns nos livros, outros na música,... Além de me refugiar nos livros e na música, também me refugio em blogs. Isto para dizer que o teu blog tem essa capacidade, de oferecer consolo às pessoas. Dou por mim muitas vezes a obter o conforto, consolo e motivação que preciso nas tuas palavras.
    Foi isso o que este post representou para mim ao lê-lo. Num dia em que me senti mais desanimada, curiosamente também sobre este tema, ler este post foi o consolo e motivação de que precisava. Saber que não sou a única que me sinto assim, saber que existem pessoas como eu também se sentem por vezes cansados de tanto lutar, saber que não é só o mar de rosas de objetivos bonitinhos que aparecem nos blogs e em que todos parecem estar a cumprir tudo.
    Abandonei a prática de fazer metas anuais precisamente por isso. Porque não existem prazos para os nossos sonhos. O importante é nunca desistirmos dele e nunca baixarmos os braços, mesmo que tenhamos de dar uns passos para trás para depois fazer um grande avanço, como tu bem referiste.
    A comparação da seta está espetacular, acho que vou colocá-la na minha secretária para olhar sempre para ela ( tenho um vidro na minha secretária, onde ponho as citações que mais me inspiram).
    Muito obrigada por este post <3
    Beijinhos,
    Cherry
    Blog: Life of Cherry

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  4. Este texto espelha o que é a minha vivência actual, Inês. E é, de certa forma, fortalecedor saber que não passamos pelo mesmo sozinhas. Ver objectivos, metas, marcos por rasurar na nossa lista é das piores coisas para a motivação e, inevitavelmente, deita-nos abaixo. Mas a diferença está, de facto, no que fazer quando somos confrontados com esta realidade. A analogia da seta é muito bem pensada para este assunto porque explica, precisamente, que alguns passos atrás podem até ser fortalecedores. :)

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  5. Adorei a analogia da Bia. Este texto fez-me lembrar aquela imagem em que comparam 2 mineiros à procura de ouro: 1 desiste, quando na imagem estava mesmo perto de alcançar o objtetivo; o outro continua energeticamente a trabalhar apesar de estar mais longe. Tudo isto para dizer que quando qeremos mesmo algo, não devemos desistir porque não sabemos se estamos perto de a alcançar. Também costumo dizer que quando as coisas nos correm mal, aquilo que temos de fazer é aprender, porque os obstáculos que nos aparecem na vida ensinam-nos muito e fazem com que seja mais delicioso saborear as nossas vitórias
    Por onde anda a Sofia?

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  6. A 18 de Março de 2017, terminei uma publicação da seguinte maneira "Acreditar nem sempre é a questão. É importante, é algo fundamental, é o balanço que conferimos a uma flecha para que ela possa concluir o seu trajeto, mas se não puxarmos pela corda, a flecha não ganhará vida própria, nem tão pouco chegará ao seu alvo. Para além da crença, há que fazer dela a nossa parceira e trabalhar por nós. Para além da força de vontade de pegarmos no arco, encaixarmos a flecha e puxarmos a corda, há que saber fazê-lo de forma correta e não ter receio de deixar fluir o acontecimento."
    Agora que leio a tua publicação, vejo o quão parecidas se tornaram, devido à mesma analogia, e nem sabes o quão confortável me senti, após ler as tuas palavras. É como eu digo, tudo acontece por uma razão e parece que quando eu mais preciso de me reerguer, para além de me reencontrar nos meus, o meu corpo é trazido até aqui, ajudando-me ainda mais!
    Obrigada, Inês, pela força, por acreditares em ti, em nós, em todos aqueles que te rodeiam, obrigada por nunca nos deixares desistir! Nem sabes o quão melhor me encontro agora! ♥

    LYNE, IMPERIUM

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  7. Que texto excelente e inspirador. Identifiquei-em tanto. É muito, muito reconfortante. Como diz o primeiro comentário, é importante definir timings mas não obcecar com eles. Ter confiança e fé, mas também o realismo necessário para saber que por norma as coisas demoram 3x mais tempo a acontecer do que o tempo que desejaríamos...faz parte.

    Parabéns pelo post, mesmo. Muito bem escrito e muito maturo!

    Claudia - Mulher XL
    www.mulherxl.pt

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