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À meia-noite da virada do ano, prometi-me que ia sair de casa. Não faço muitas promessas – nem com os outros, nem comigo – porque não prometo o que não posso cumprir. Nunca. E, por isso, sabia que, naquela manhã de dia um, teria de abrir a porta de vez e sair de casa.
Construí todas as alas desta casa ao detalhe; percorro-as de olhos fechados, abertos, e até quando nem me apercebo que o estou a fazer.
Tudo nesta casa tem um design pensado para mim, nos meus gostos, nos meus medos, nos meus traços, nos meus nojos, nos meus favoritismos. Sei quais os lugares que me permitem estar confortável e os espaços que mostram as fendas. Nem sempre dou por mim a observá-las mais tempo do que deveria, a tentar reparar, tapar as rachas, cada ano com melhores materiais e, a cada ano, a encontrar novas.
A minha casa tem perfumes deliciosos e fotografias de momentos e coisas que, às vezes, nunca consegui fotografar. Tem pessoas que não morrem, não desaparecem, não envelhecem. Tem objetos que nunca ficam enfraquecidos pelo sol ou pelo tempo. Tem uma sala de arquivos onde atravesso o tempo e me pergunto, muitas vezes, se tenho cópias únicas de algumas referências.
A minha casa não tem paredes, mas tem portas. Algumas atravesso a medo, outras descubro que sempre estiveram à minha espera para explorar. Não sei quanto vale por m2, mas não a colocaria à venda. Nem para arrendar. Não gostaria que ninguém vivesse cá. Mas eu vivo demasiado tempo aqui.
Não faço nada sem me demorar a sair de casa. E, se fizer ou disser, regresso a casa e ando às voltas numa divisão a desempacotar tudo o que trouxe dessa ida. A volta pode ser extenuante, mas não sair é ainda mais exaustivo. Ficar não é opção.
Muitas vezes, perdi o horário, o timing, porque saí de casa tarde demais. Perdi-me demasiado nas reorganizações de uma casa que nunca tem pó, mas que limpo constantemente. Distraio-me de sair de casa enquanto convivo no caos meticulosamente criado à minha imagem. E os dias passavam.
Já abri várias janelas para que outros pudessem espreitar a minha casa. A desarrumação, claro, não está à vista nesses momentos.
Dia um, prometi-me que ia sair de casa. Que não precisava de atravessar tantas divisões ou portas para fazer algo. Que não precisava de ir a alas específicas para dizer algo. Que não preciso de ficar o dia todo cá dentro. Faz bem sair, simplesmente sair, fazer, dizer, experimentar, orientar o dia sem precisar de estar em casa.
Adoro esta casa. Umas vezes mais e, outras vezes, muito menos. Mas vou gostando cada vez mais e sinto-a mais convidativa com o passar dos anos. Com mais luz natural. As janelas cada vez mais viradas para sul, a brisa mais leve. Mas nenhuma casa é feita para ser vivida a tempo inteiro. É preciso sair.
E então, saí de casa. Quando volto, volto sem bagagem, apenas o estritamente necessário. Já tenho inventário suficiente. Faço um chá e acolho-me. Quanto mais saio de casa, mais gentil fica voltar.
Reading...
Três! É um regresso a este livro, que agarrei no ano passado e depois interrompi a nossa relação porque sabia que o queria ler num outro momento. Ainda estou muito no início, mas parece ter aquelas descrições deliciosas do verão – talvez um contrassenso lê-lo em março e com este tempo, mas tem sido um bom equilíbrio.
Eating...
Descobri uma nova receita de massa preferida: rigatoni com molho de pesto, pistachio picado e limão. Absoluta perfeição.
Playing...
Descobri o canal da Desi no Natal, mas tem sido a minha companhia nos dias de chuva em que tudo o que queremos é estar acolhidos em casa e observar outras realidades e estilos de vida.
Obsessing...
A nossa casa – bom, não a do texto, essa é só minha. A nossa, com as nossas coisas, as nossas referências, os vestígios das nossas rotinas. Há uns dias dei por mim na rua a pensar que mal podia esperar por regressar a casa e, inevitavelmente, sorri.
Recommending...
Nem só de promessas fiz o dia 1 de janeiro. Também me comprometi a fazer journaling todos os dias e, pasmem-se, tenho cumprido. Não falhei um único dia, por mais caótica que a vida estivesse, e muito me orgulha pensar nisto, principalmente quando os meus hábitos de journaling consistiam em escrever consistentemente durante 2 semanas e depois abandonar o caderno. Poupo-vos de amplificar os benefícios que todos nós já lemos e sabemos sobre.
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