Não precisei de muito para as convencer a incluir Hallstatt no nosso roteiro – uma imagem vale mais do que mil razões -, mas o mesmo não podemos dizer da viagem de Salzburgo até Hallstatt. Munidas de paciência, vontade e da fé inabalável que só quem é turista e se desenrasca reconhece, traçámos o plano e partimos para aquele que seria o momento mais bonito da nossa viagem pela Áustria.
‘Uma armadilha para turistas’, tanto nos alertaram, e nós caímos nela com o prazer de quem sai do autocarro e vê um cenário idílico, que nos apanha em falso pelo encanto – quem é que fica imune a tal paisagem? Espero nunca ficar.
Não sei se me senti assoberbada ou reconfortada pelo o recorte desta vila; as serras verdejantes e montanhas abraçam-nos em toda a sua imponência, e o lago azul abraça as casas pitorescas, dá abrigo aos cisnes, e refresca as mãos de quem as desliza pela água enquanto anda de barco. Quis que fosse verão, que pudesse correr pelos longos passadiços de madeira para mergulhar a fundo naquela água e fazer parte integral deste cenário, como vi tanta gente fazer antes, quando este ambiente não passava de um registo na lente dos outros. Não o fiz – fica a inquietação de quem quer voltar para uma desforra.
Tudo está em flor em Hallstatt: nos canteiros, nos cemitérios (tão cheios de vida, a minha ironia predileta), nos parapeitos das casas onde queria morar com um livro, uma reforma confortável e um amor que seria casa em qualquer lugar no mundo. As ruas transportam-nos para um imaginário utópico que só reconhecia nos livros que me faziam adormecer em criança e nos filmes que marcaram a minha preferência por finais felizes – quem não quer ser a Bela nesta vila (onde não nos importamos que 'tudo seja igual')?
Garantiram-nos que iriamos conseguir ver e absorver tudo num só dia e a dimensão da vila cumpre-o. Mas a vontade é de lá ficar, de desacelerar e idealizar umas férias, um verão. Registo os detalhes com a minha câmara, não quero que me escape nada – sei que não vou acreditar que estive ali. Ainda agora, que vos escrevo e relato neste diário de bordo, parece irreal que tenha caminhado nestas ruas. Uma ficção que adoro recordar que é verdadeira.
Na praça principal, escolhemos um restaurante típico para nos aquecermos por fora e nos reconfortarmos por dentro. Chegaram à mesa sopas que sorvemos em sossego, observando as pessoas a passar, processando umas com as outras o privilégio que estávamos a testemunhar, a fazer parte. Terminámos com colheradas de apfel strüdel e um bolo de chocolate – pedi-o em alemão sob escuta da minha amiga, confiante e orgulhosa, o meu rosto a enrubescer, típico de quem se ouve numa língua que não é sua e se pergunta quem nos tomou a voz. Correu tudo bem.
Quando regressámos para Viena, cansadas, e em mim a crescer aquela melancolia insidiosa de quem antecipa uma aventura a chegar ao fim, pensei no quanto queria lá voltar e no quanto estava grata por ter conhecido este lugar com elas. Um espaço onde me idealizo a ter o sossego familiar do sol, do descanso e de um mergulho no lago, só fazia sentido ser partilhado com pessoas que considero família. Espero regressar leal a esta sensação.
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