FILMES || Spotlight


Este filme tinha tudo para correr mal. Tudo para se tornar num escândalo político e religioso, no qual todas as atenções se iam desviar dos dois focos centrais desta produção: o tema sério - muito sério - sobre abusos sexuais em crianças por parte de padres e outros membros religiosos e a integridade jornalística que, a cada geração que passa, vai-se perdendo.
Tinha tudo para correr mal, mas quando a produção é bem feita, quando o foco está nos detalhes certos, no tempo certo de as referir e mostrar, grandes filmes com poderosas mensagens conseguem ser feitos com a mínima polémica possível - que ainda assim existiu e existirá sempre quando os assuntos são tão delicados como este -.

O filme é tão profissional como a equipa de jornalistas retratada que faz a investigação dos casos de abuso sexual em Boston por parte de padres. Não há entradas suaves, não há eufemismos, não há falinhas mansas neste filme; A realidade é retratada, pura e crua, mas o que nos choca, o que nos provoca a raiva, o desconforto e o desequilíbrio que os próprios jornalistas sentiram não é só os relatos comoventes e desconcertantes nem não são as imagens chocantes (que não existem e eu acho que este golpe foi de génio e de extrema elegância). É a proximidade com que o filme nos faz sentir com os casos. Podia acontecer a qualquer um de nós. Como em tudo na vida e como em qualquer ambiente, é certo. Não acontece só com padres, basta olharmos em redor no nosso mundo e qualquer lugar é, infelizmente, uma oportunidade. Mas, e apesar de já sabermos que é como tudo na vida, esquecemo-nos. Não ligamos. Não nos interessa porque não é connosco, porque não aconteceu. E nem imaginamos a proximidade com que poderá ter acontecido, ou o quão perto pudéssemos estar disso. Spotlight deixa-nos desconcertados porque é real. Porque a história não é só verídica como é palpável. Porque nos deixa incrédulos e chocados como é possível contornar-se assuntos tão sérios e delicados com meros acordos e cartas jogadas debaixo da mesa. Se fosse connosco? Com os nossos? Com os que convivem connosco? 

Faz falta jornalismo assim. Íntegro. Que fazem jornalismo por competência, por vocação e não por interesses e acordos financeiros. Que não se manipula nem se deixa levar pelas intrigas e pelo escândalo gratuito. E eu, que nem sou nada fã da Academia e que assisto às cerimónias por desporto e humor, fiquei agradavelmente surpreendida e orgulhosa pelo galardão merecido. O tema é pertinente. Vamos abrir os olhos. Vamos apertar nos sítios onde dói. E vamos apostar em mais jornalismo sério.

Poster

4 comentários

  1. É um filme que quero muito ver. Obrigado pelo feedback =)

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  2. Será que é estas férias que vejo este filme?! Espero bem que sim!

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  3. Já vi o filme e fiquei com uma dor dentro de mim depois de ter acabado. É brutal a forma como nos faz pensar e nos faz ficar presos. Adorei o filme precisamente pelo que disseste; pela forma como retrata o que é real e que é, muitas vezes, esquecido. Porque só acontece aos outros. Mas não. E tens razão; deveria existir mais jornalismo assim, este é o verdadeiro caminho.

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