Viena Postcards


Soube que Viena gostava de mim antes de ela saber que eu gostava dela. À distância, reparava nos pormenores que me faziam desconfiar desta compatibilidade: a sua aparência chamou-me atenção, e depois a cultura, o que tinha dentro, à mercê de quem se atreve a visitá-la. 


Olhava para as suas fotografias e sabia o que me queria dizer. Vem cá. Mora em mim, se me quiseres como casa. Discreta e elegante, mas sem rodeios nem floreados. 

Soube-o porque me contaram. Os que foram antes, relataram-me que Viena contava, em surdina, que gostava de mim. E que eu também ia gostar dela. Quem foi, garantia-me: como não gostar? 

Como num encontro onde as inseguranças arrefecem o que já está quente nas expectativas e no coração, eu também tinha tudo para começar a voar com medo. As minhas amigas partiram assim. O plano replaneou-se e as noites acordada prolongaram-se no nervosismo de que um dos pormenores corresse mal por maior. Mas voei para Viena segura, um otimismo doce. Ninguém o quer estragar. Quando crescemos, não há coragem para estragar uma felicidade que só nos lembramos de ter em pequenos. 



Foi amor ao primeiro passo. Como quando conhecemos alguém que parece ter-nos conhecido toda a vida; lê os nossos pensamentos; interpreta as nossas frases; perdoa as nossas imperfeições. Gosta do que nós gostamos. Gosta de nós. 

A Viena, uno-me pela sua herança, mas não tenho segundas intenções. Gosto da sua história, do seu estilo. Que acredite que tudo o que existe pode sê-lo com beleza e organização. Há música nas ruas de Viena, nem sempre audível. Por vezes, tem de ser trauteada por quem sabe que ali já houve música que se ouvia, sonhava ou aprendia. 

Não nos poupa a agrados, embora também não nos poupe. Sabe que custa ser tão especial. 



Mais do que os palácios majestosos, jardins encantadores e obras de arte sublimes, aquilo que mais observei em Viena foram as pessoas. Os seus pormenores, os seus detalhes, a sua curadoria estética tão única e inimitável. Sentámo-nos num café onde, para cada mesa, não havia uma cadeira igual. Todas desempenhavam a sua função ao seu estilo, com a sua beleza. Pensei que o mesmo se aplicava às pessoas com que me cruzava, numa vontade de viver e ser o que elas viviam e eram, de morar ali. De morar onde Viena prometia casa, sem passar de conversa de apaixonados. Do futuro que não está escrito, mas que é tão delicioso, tão imenso, que não conseguimos resistir em partilhá-lo com quem pensamos dividi-lo. A melhor parte do futuro é aquilo que achamos que vai acontecer à nossa maneira. Apenas superado pelo sublime de acontecer de outra maneira e ser melhor.



Viena veste-se de elegância e neutralidade de dia e de negro e luz à noite. Num apartamento maravilhoso – mais privilégio da pesquisa do que do nosso poder económico – guardámos a mesa da cozinha para realinhar, para partilhar os chás, as comidas quentes que preparávamos em improviso, os registos do dia (aqueles que falávamos ou registámos) e, acima de tudo, o silêncio apenas confortável por quem se conhece e se lê sem ter nada escrito na voz.


Se Viena tivesse um bilhete a dizer que gostava de mim e se perguntasse se era recíproco, a resposta não teria um não, nem talvez. As certezas são poucas na vida e há que aproveitá-las quando as temos.

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