Quando penso em Harry Potter e em todo este universo especial, recordo-me sempre de duas pessoas incríveis: a minha tia e o Ricardo. Apesar de hoje celebrarem-se duas décadas desde o lançamento do primeiro livro de Harry Potter, a sua edição traduzida para português só foi lançada alguns anos depois, mais especificamente, dois dias antes do meu aniversário, em 1999. Eu não sabia ler, mas a minha tia - uma adulta que eu nunca tinha visto a ler outra coisa que não livros de adultos - estava rendida a um livro com uma capa de bonecos e o Ricardo - o meu amigo "crescido" - que eu nunca o via a ler, estava absorto nos capítulos. Tinha de saber o que era.
Só no Verão do meu segundo ano de escola é que, finalmente, pude ler o tão badalado Harry Potter e a Pedra Filosofal. Já tinha lido alguns livros "sem bonecos" e demonstrado que tinha capacidade para ler um livro daquela desenvoltura e, embora estivesse a existir uma enorme polémica sobre se os livros seriam apropriados para crianças ou não - havia ali uma certa questão em torno do terror, uma vez que os outros livros já tinham sido publicados e eram cada vez mais pesados -, a minha tia garantiu à minha mãe que o primeiro era levezinho e que eu podia ler à vontade. Lá iniciei o meu primeiro capítulo e... detestei.
Sabia que era um livro sobre magia mas, ao ler o primeiro capítulo, senti uma completa desilusão. A narrativa era sobre um casal mundano, sem qualquer tipo de piada, chatos e com uma rotina nada mágica ou extraordinária. Isto, para uma criança de sete anos, foi uma enorme facada. Onde estava todo aquele deslumbramento que fazia uma adulta e um rapaz que não lia absorverem-se na história? Fiz aquilo que nunca faço: desisti de um livro.
Nesse mesmo ano, foi lançada a adaptação para cinema. O Ricardo estava um sino e a minha tia desolada porque não teve tempo de o ir ver ao cinema. Uma noite, chegou a casa com o VHS - sim! Nada de DVD! - alugado e fez pipocas queimadas - como sempre - para assistirmos juntas ao universo que estava a conquistar tantas e tantas pessoas. E fiquei apaixonada. Nessa noite, voltei a tirar o meu livro da estante e esforcei-me para superar aquele casal aborrecido. Desde então, a minha vida nunca mais foi a mesma.
Parece exagero e muitas vezes perguntam qual é a fixação das pessoas em relação a estes universos de culto como Harry Potter, Star Wars, Senhor dos Anéis ou até bandas como os Beatles. Para quê tanta adoração? É simples. Porque existiram na nossa geração. Harry Potter existiu na minha geração. E envolvem não só toda uma série de factores que conduziram ao sucesso (a história bem contada, o enredo fascinante...) como também marcam uma série de memórias e acontecimentos da nossa vida que só se proporcionaram graças a estes fenómenos; Harry Potter fez com que eu e a minha tia nos sentássemos na sala a comer pipocas queimadas e a ver os filmes (dobrados em português nos primeiros porque era tão nova que ainda nem conseguia ler as legendas) e criou um laço que, ainda hoje, é apertado. Ainda hoje falo sobre a história com a minha tia, vemos juntas os filmes, comentamos os livros - ela leu sempre primeiro e depois oferecia-me os livros, sem nunca dar spoiler -. Harry Potter introduziu um amigo meu para o mundo da literatura, ao qual não havia antes tocado e ensinou-me que nunca devemos desistir de nenhum livro, porque podemos estar a perder a história mais encantadora de todas. Harry Potter fez com que eu e o Ricardo brincássemos ao xadrez dos feiticeiros na sala, fez com que fôssemos juntos à Fnac para comprar os livros, cada vez que saiam - a edição inglesa vinha sempre muito tempo antes da portuguesa, portanto, ele comprava e depois ajudava-me a ler os capítulos em inglês -.
Cadernetas de cromos, VHS e, depois, DVD, brincadeiras no recreio, pessoas a ler nos corredores da escola, em grupos. Tudo isto marcou o meu crescimento. Ver os meus primos da Austrália a trazer as edições inglesas nas férias para termos acesso aos livros antes de eles chegarem a Portugal e lermos todos às cotoveladas na toalha, um sempre a refilar com o outro "NÃO VIRES A PÁGINA, ainda não cheguei ao fim". Ouvirmos boatos, na escola primária, de que o Harry ia ficar com a Ginny e não com a Hermione, e ficarmos boquiabertos de choque. Um dos meus colegas apostar gomas em como era um boato falso. Tudo isto faz parte das minhas memórias. E, claro e inegável, o meu gosto por ler, que surgiu durante aquela luta no primeiro capítulo da Pedra Filosofal. Antes, lia para atingir o objectivo de "ler como um crescido". Agora, lia pelo prazer de conhecer uma história e isso foi muito importante para a formação dos meus próprios interesses. Portanto, sim, a minha vida nunca mais foi a mesma. Foi mais rica, mais interessante, mais intelectual, curiosa e, obviamente, mais mágica.
Para mim, Harry Potter nunca vai ser apenas aquilo que é: um fenómeno. É a minha infância. A minha introdução na literatura. As minhas memórias felizes. O meu passatempo. Eu cresci com O Rapaz Que Sobreviveu e vou sempre olhar para ele com um sorriso e um carinho fraterno. Afinal de contas, ele esteve lá. Sempre.
Não sou fã do Harry Potter mas há tanta gente a falar que me faz querer ler os livros para descobrir a magia!
ResponderEliminarBeijinhos
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Não fiz parte da geração Harry Potter mas acabei por me integrar também nos amantes da saga. Faz em Agosto quatro ou cinco anos que fui para a aldeia e o meu irmão enfiou-me Pedra Filosofal à socapa na minha mala e numa das minhas reclamações de não haver nada para fazer ele sugeriu-me ler o raio do livro. Como não tinha mesmo nada que fazer aventurei-me um bocado naquela onda de fazer a vontade a alguém. Comi o livro e só queria que as férias acabassem para vir buscar o resto à estante. Foi assim que me apaixonei por Harry Potter. Lembro-me tão bem de ficar até de madrugada a ler "só mais um capítulo" e a esconder-me dos meus pais porque eu precisava de saber mais e dava tanto por voltar a sentir a história pela primeira vez, a magia é mesmo essa. Harry Potter é todo um mundo e lembro-me da angustia de virar as ultimas páginas de talismãs da morte, de chorar com a lily e o snape, do aperto no peito na parte do basilisco, do encontro do Harry e do Voldy na floresta, do cemitério e da Bathilda Bagshot. Proporcionou-me o friozinho na barriga ao pegar no carrinho na plataforma, dos saltitares na millenium bridge ao relembrar os filmes, de subir as escadarias da Lello boquiaberta, de encontrar cursed child à venda em inglês algures em Paris pq já tinha esgotado em Portugal, ao tentar obter spoilers e o meu irmão não se desbocar e a este obrigar-me (sempre!) a ler o livros antes de ver os filmes e de apresentar inúmeras vezes os livros na escola. Eu levava os livros para onde fosse porque nunca se sabe. Harry Potter é tão rico, tão mágico e belo e tem um lugar muito especial no meu coração! Harry Potter são muito mais que feitiços e fantasias, é um universo cheio de coisas incríveis. Always.
ResponderEliminarNa minha infância ouvia muitas vezes as minhas primas já adolescentes conversarem muitas vezes sobre os livros da saga mas nunca liguei muito a isso. Apenas no verão passado comecei a ler os livros e a ver cada filme depois da leitura da respetiva obra literária. Desde então, sou uma fã da saga assumida e considero que muitos dos ensinamentos que obtive durante este ano foi graças às personagens criadas por J. K. Rowling. :)
ResponderEliminarBonito texto, Inês. Parabéns. :)
Beijinhos grandes.
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O Harry Potter também fez parte da minha infância, mas foram mais os filmes, porque os livros não os li ( eu sei, é um crime, mas na altura não quis ler por já ter visto os filmes). Mas agora vou ler os livros este verão.
ResponderEliminarApesar de não ter lido os livros, o Harry Potter marcou muito a minha infância. Lembro-me da primeira vez que vi " Harry Potter e a Pedra Filosofal" na televisão, com a minha prima, ainda era eu muito novinha, e lembro-me do entusiasmo e encanto que sentir por aquele mundo mágico. Nos anos seguintes, ia sempre toda entusiasmada ver os filmes ao cinema... É mesmo como tu dizes, Harry Potter não nos marcou só por ter sido um fenómeno, mas porque faz parte de uma geração.
Quero mesmo ler os livros para poder viver, com mais profundidade, a magia da minha infância :).
Adorei o post, Inês :). Uma linda homenagem ao mundo do Harry Potter :).
Beijinhos,
Cherry
Blog: Life of Cherry
Não deixes de ler, Cherry! Os filmes cortaram uma série de personagens e histórias secundárias. Não vais sentir que estás a ler uma repetição do que já viste, muito pelo contrário. A leitura enriquece toda a trama :)
EliminarTenho mesmo que ler então! Depois do que disseste no Twitter, fiquei mesmo curiosa!
EliminarA serio nem acredito que já passaram 20 anos, parece que foi ontem!
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